Comportamento e Ecologia dos Cervídeos Brasileiros: Uma Revisão das Espécies e Suas Estratégias Adaptativas

Série: Conservação e Manejo de Fauna/ Comportamento e Bem Estar Animal/Cervídeos Projeto: Eco Cidadão do Planeta ICA/UFMG. Artigo Técnico/ Conscientização/ Ponto de Vista nº 2 Autoras: Ana Clara Silva Pereira Nunes e Letícia Carvalho Borges Orientador: Prof. Délcio César Cordeiro Rocha ICA/UFMG

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Doutor Zoo

9/25/2025

Comportamento e Ecologia dos Cervídeos Brasileiros: Uma Revisão das Espécies e Suas Estratégias Adaptativas

Série: Conservação e Manejo de Fauna/ Comportamento e Bem Estar Animal/ Cervídeos

Projeto: Eco Cidadão do Planeta ICA/UFMG.

Artigo Técnico/ Conscientização/ Ponto de Vista nº 2

Autoras: Ana Clara Silva Pereira Nunes e Letícia Carvalho Borges

Orientador: Délcio César Cordeiro Rocha ICA/UFMG

Resumo

A família Cervidae está representada no Brasil por espécies de significativa importância ecológica e cultural, como o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus), o veado-mateiro (Mazama americana) e o veado-catingueiro (Mazama gouazoubira). Este artigo tem como objetivo revisar e sintetizar os aspectos etológicos dessas espécies, com ênfase em sua estrutura social, comunicação, uso de habitat, comportamento alimentar e estratégias reprodutivas. A compreensão desses padrões comportamentais é fundamental para a criação de estratégias eficazes de conservação para estes animais, muitos dos quais enfrentam graves ameaças devido à perda e fragmentação de seus habitats.

Palavras-chave: Cervídeos Brasileiros; Blastocerus dichotomus; Mazama gouazoubira. Mazama americana; Comportamento animal; Conservação.

Introdução

Os cervídeos são componentes essenciais dos ecossistemas brasileiros, atuando como dispersores de sementes e presas para grandes carnívoros. No entanto, a fauna nacional de cervídeos é pouco diversa se comparada a outras regiões, porém altamente especializada. As espécies mais emblemáticas incluem o majestoso cervo-do-pantanal, o maior cervídeo da América do Sul, adaptado a ambientes alagáveis; o veado-mateiro, um habitante de florestas densas e de maior porte do gênero Mazama; e o veado-catingueiro, uma espécie mais adaptável a ambientes abertos e secundários. Este artigo busca explorar o comportamento destas três espécies, destacando suas particularidades e adaptações aos biomas brasileiros.

A família Cervidae apresenta ampla diversidade e distribuição global, mas no Brasil apenas algumas espécies habitam ecossistemas como florestas tropicais, cerrados e áreas alagadas (DUARTE; REIS, 2012). Entre elas, destacam-se o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus), maior cervídeo da América do Sul e típico de áreas alagáveis, o veado-catingueiro (Mazama gouazoubira), amplamente distribuído em ambientes abertos e semiáridos, e o veado-mateiro (Mazama americana), associado a florestas densas (TOMAS; DUARTE, 2012).

Os cervídeos brasileiros compreendem uma diversidade de espécies que habitam diferentes ecossistemas do país. Dentre as principais espécies, destacam-se o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus), o veado-catingueiro (Mazama gouazoubira) e o veado-mateiro (Mazama americana). Cada uma dessas espécies apresenta adaptações morfológicas e comportamentais que as permitem prosperar em seus respectivos habitats, que variam desde as extensas áreas alagadas do Pantanal até as florestas tropicais e matas secas.

O cervo-do-pantanal, em particular, é considerado um símbolo da fauna brasileira, sendo um dos maiores cervídeos da América do Sul. Este herbívoro é adaptado a ambientes aquáticos, utilizando sua habilidade de nadar para escapar de predadores e para forragear em áreas inundadas. Sua presença é crucial para a manutenção do equilíbrio ecológico do Pantanal, onde desempenha um papel na dispersão de sementes e na gestão de vegetação aquática. Por outro lado, o veado-catingueiro e o veado-mateiro mostram-se mais adaptados a florestas e regiões de cerrado, onde também exercem importantes funções ecológicas.

O estudo do comportamento desses animais é fundamental para compreender sua ecologia e subsidiar planos de manejo e conservação. A destruição de habitats, a fragmentação florestal e a caça representam ameaças significativas, tornando urgente o aprofundamento em pesquisas sobre etologia aplicada à conservação (EISENBERG; REDFORD, 1999).

Essas espécies de cervídeos possuem características morfológicas distintas, como tamanhos variados, pelagem que pode variar conforme o habitat e comportamentos sociais que incluem a formação de grupos mais ou menos coesos, dependendo da densidade populacional e da sazonalidade dos recursos alimentares. O comportamento reprodutivo é, igualmente, uma característica interessante destes cervídeos, com rituais de courtship que podem influenciar a dinâmica populacional local. A compreensão desses aspectos é fundamental para a conservação e o manejo adequado dessas espécies em seus habitats naturais.

Este artigo apresenta uma revisão sobre os principais aspectos comportamentais desses animais no Brasil, com enfoque em vida em grupo, demarcação de território, comunicação, vocalizações, comportamento alimentar, forrageamento, migração e reprodução. Observa-se que essas espécies apresentam diferentes estratégias adaptativas: enquanto o cervo-do-pantanal é mais gregário e ocupa áreas alagadas, os veados do gênero Mazama são territorialistas e solitários. A compreensão desses padrões é essencial para subsidiar estratégias de conservação diante das crescentes ameaças de perda de habitat e caça ilegal.

Vida em Grupo e Comportamento Social

Espécies em Foco e Suas Adaptações Comportamentais

· Cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus): Adaptado à vida no Pantanal e em outros wetlands, possui patas longas e cascos expansíveis para locomover-se em terrenos alagados. Seu comportamento é influenciado pelo pulso de inundação, deslocando-se sazonalmente entre áreas mais elevadas ("cordilheiras") e baixas ("baías") (TOMAS et al., 2010). Sendo maior cervídeo sul-americano, ocupa áreas alagáveis no Pantanal e regiões adjacentes. É considerado vulnerável à extinção.

· Veados-mateiro (Mazama americana): É uma espécie tipicamente florestal, associada a matas primárias e secundárias densas. Possui coloração avermelhada que oferece camuflagem no sub-bosque sombreado. Seu comportamento é geralmente solitário e discreto, espécie florestal e discreta, de difícil observação, geralmente solitária e com hábitos noturnos.

· Veados-catingueiro (Mazama gouazoubira): É a espécie mais comum e adaptável, ocorrendo em cerrados, caatingas, bordas de floresta e até áreas agrícolas. De coloração acinzentada/amarronzada, é menor e menos dependente de cobertura florestal contínua que o mateiro, exibindo maior plasticidade comportamental, com hábitos generalistas, ocorre em diferentes biomas, do cerrado às áreas semiáridas, sendo mais tolerante à presença humana.

Os cervídeos brasileiros, caracterizados por uma diversidade de espécies, demonstram variações significativas em seus comportamentos sociais e organização em grupos. Um exemplo notável é o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus), que, em muitos casos, se reúne em grupos gregarious. Esses grupos oferecem vantagens adaptativas, como proteção contra predadores e maior eficiência na busca por alimentos. A formação de bandos no cervo-do-pantanal contribui não apenas para a segurança, mas também para a sociabilidade, permitindo interações sociais complexas que são cruciais para a sobrevivência da espécie.

Por outro lado, os veados do gênero Mazama, como o veado-campeiro (Mazama gouazoubira) e o veado-mateiro (Mazama branquinegra), apresentam um comportamento mais solitário ou em pequenos grupos. A estrutura social desses veados é menos complexa, refletindo um estilo de vida que é fortemente ligado ao habitat denso e às estratégias de forrageamento. Apesar do comportamento mais individualista, os membros desses grupos menores ainda se envolvem em interações sociais, que incluem a comunicação através de vocalizações e posturas corporais que ajudam a estabelecer hierarquias e situações de reprodução.

Em relação à hierarquia social, tanto o cervo-do-pantanal quanto os veados do gênero Mazama demonstram comportamentos que ajudam a definir posições dentro dos grupos. O cervo-do-pantanal, por exemplo, pode apresentar um sistema de dominância em que os machos mais fortes têm prioridade no acesso a fêmeas e recursos. No caso dos veados Mazama, embora as interações sociais sejam mais discretas, a manutenção de hierarquias ainda é observada, especialmente durante a época de acasalamento. Essas dinâmicas sociais não apenas influenciam a reprodução, mas também desempenham um papel essencial na forma como essas espécies respondem às pressões ambientais e de predadores.

Demarcação de Território e Comportamento Territorial

A estrutura social reflete as adaptações ao habitat:

· Cervo-do-pantanal: Exibe a tendência mais gregária. Podem ser observados em pequenos grupos familiares ou bandos maiores, especialmente durante a estação seca, quando se concentram em corpos d'água remanescentes. Machos são geralmente solitários fora da época reprodutiva.

· Veados-mateiro e catingueiro: São predominantemente solitários. As interações sociais são breves, ocorrendo principalmente entre mãe e cria e durante o período de acasalamento. A solitariedade é uma adaptação para evitar detecção por predadores em ambientes fechados (floresta) ou abertos (cerrado), respectivamente (DUARTE & REIS, 2012).

A demarcação de território e o comportamento territorial são aspectos fundamentais na ecologia dos cervídeos brasileiros, influenciando suas interações sociais e a utilização do espaço. Esses comportamentos variam significativamente entre as diferentes espécies, refletindo as distintas demandas ecológicas e adaptações que cada uma apresenta. Os cervídeos utilizam uma variedade de métodos para estabelecer e defender seus territórios. Tais métodos podem incluir a marcação de odores, vocalizações, e exibições físicas. Por meio da marcação com urina, fezes e secreções glandulares, os cervídeos sinalizam sua presença e delimitam os limites de seu espaço, premeditando a defesa contra intrusos.

A diversidade morfológica entre as espécies de cervídeos está intrinsecamente ligada às suas adaptações comportamentais. Por exemplo, espécies que habitam florestas fechadas, como o veado-catingueiro (Mazama gouazoubira), tendem a ser solitárias e discretas, enquanto espécies de áreas abertas, como o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus), podem formar grupos maiores para melhor detecção de predadores (DUARTE & REIS, 2012). A presença de galhadas, uma característica marcante da família (presente principalmente nos machos), é central em comportamentos de disputa por fêmeas e demarcação de status social.

O cervo-do-pantanal tende a formar pequenos grupos familiares, sobretudo em áreas de abundância alimentar, enquanto os veados do gênero Mazama apresentam comportamento solitário, exceto durante a época reprodutiva (TOMAS; DUARTE, 2012).

Entre as espécies brasileiras, os veados do gênero Mazama se destacam por apresentarem um comportamento mais territorialista. Esses animais, frequentemente encontrados em florestas e áreas de vegetação densa, investem tempo e recursos na defesa de seus territórios. Suas ações podem incluir confrontos físicos com outros machos, além de uma intensa atividade de marcação no local. Observou-se que indivíduos adultos tendem a sustentar territórios que possibilitam acesso a recursos alimentares e de acasalamento, o que é crucial para sua sobrevivência e reprodução.

Por outro lado, espécies como o cervo-do-pantanal demonstram comportamentos menos territorialistas. Apesar de também utilizarem marcação de território, sua estratégia é muitas vezes mais flexível, permitindo que esses cervídeos se movam em áreas maiores, especialmente em resposta a mudanças sazonais em recursos disponíveis. Essa adaptação pode ser considerada uma resposta às exigências do habitat do Pantanal, que é mais móvel e dinâmico em comparação com os ambientes mais estáveis que outros cervídeos habitam. Essa variação nos comportamentos territoriais ilustra não apenas as diferenças adaptativas entre as espécies mas também os complexos ecossistemas que abrigam os cervídeos no Brasil.

Comunicação e Vocalizações

A comunicação química é o sentido mais desenvolvido nos cervídeos neotropicais, crucial para animais muitas vezes solitários e de hábitos crepusculares/noturnos.

· Demarcação: Machos de todas as espécies utilizam glândulas odoríferas (pré-orbitais, interdigitais, na testa) para marcar território em troncos e na vegetação. O veado-catingueiro macho, por exemplo, possui um ritual de marcação característico, esfregando a glândula pré-orbital em galhos baixos para sinalizar sua presença a outros indivíduos.

· Vocalização: As vocalizações são geralmente mais simples que as de cervídeos de clima temperado. O som mais comum é um latido/ganido de alarme, agudo e forte, emitido quando o animal se sente ameaçado. A comunicação entre mãe e filhote é feita por um balido suave.

Nos cervídeos brasileiros, especialmente em Mazama americana e M. gouazoubira, a territorialidade é marcada por raspagens no solo, deposição de fezes e urina em locais estratégicos e uso de glândulas odoríferas na face e entre os dedos (DUARTE; REIS, 2012).

A comunicação entre cervídeos é multifacetada e engloba tanto vocalizações quanto comportamentos não verbais. Os cervídeos podem emitir diferentes sons, que variam conforme a espécie e a situação social, oferecendo uma rica tapeçaria de interações. As vocalizações são uma parte crucial do repertório comunicativo desses animais, sendo utilizadas em diversas circunstâncias, como durante a época de acasalamento ou ao sinalizar perigo para outros membros do grupo.

Durante o acasalamento, por exemplo, machos podem emitir chamadas específicas que têm como propósito atrair fêmeas. Essas vocalizações muitas vezes são acompanhadas por posturas corporais que demonstram força e resistência. As fêmeas, por outro lado, podem responder com vocalizações que indicam receptividade, facilitando a comunicação e a seleção natural. Além das vocalizações associadas ao acasalamento, os cervídeos também utilizam sons para sinalizar ameaças. Quando um cervídeo detecta um potencial predador, pode produzir um som agudo que serve como alerta para outros membros do grupo, permitindo uma resposta rápida e a evasão do perigo.

A comunicação ocorre por sinais visuais (posição das orelhas e cauda), químicos (odor glandular) e sonoros (gritos de alerta, esturros dos machos em disputa). Essas vocalizações e sinais são fundamentais para evitar predadores, cortejar fêmeas e manter a coesão em grupos pequenos.

É importante notar que a comunicação não se limita a vocalizações sonoras. Sinais visuais, como a posição das orelhas, movimentos do corpo e até mesmo a forma como os animais se agrupam, desempenham um papel fundamental na interação social. Além disso, os cervídeos utilizam marcadores olfativos, como secreções glandulares, para comunicar informações sobre seu estado reprodutivo e território. Assim, a comunicação entre cervídeos é um fenômeno complexo, composto por vocalizações e comportamentos não verbais que garantem a sobrevivência e a adaptação das espécies em seu habitat. Este aspecto da ecologia dos cervídeos é vital para entender como essas espécies se relacionam entre si e respondem a desafios ambientais.

Comportamento Alimentar e Forrageamento

São herbívoros ruminantes e seletivos:

· Cervo-do-pantanal: Alimenta-se principalmente de gramíneas e plantas herbáceas das áreas alagadas, sendo um "pastador" (grazer).

· Veados-mateiro e catingueiro: São predominantemente "ramoneadores" (browsers), consumindo folhas, brotos, frutos caídos e fungos. O veado-mateiro tende a ser mais dependente de frutos de árvores da floresta, atuando como importante dispersor de sementes, enquanto o veado-catingueiro tem uma dieta mais variada, incluindo uma gama maior de folhas e até mesmo cultivos agrícolas em áreas de interface (JARDIM, 2015).

Os cervídeos são herbívoros ruminantes, com uma dieta que inclui folhas, brotos, frutos, cascas de árvores e gramíneas. Seu comportamento alimentar é influenciado pelo ritmo circadiano, sendo mais ativos ao amanhecer e ao entardecer (crepusculares), embora possam forragear durante a noite em áreas com maior perturbação humana. São animais seletivos, escolhendo plantas com maior valor nutricional, e seu forrageamento impacta significativamente a estrutura da vegetação, atuando como "engenheiros do ecossistema".

Os cervídeos brasileiros são herbívoros seletivos. O cervo-do-pantanal consome gramíneas aquáticas e plantas de áreas alagáveis, enquanto os veados do gênero Mazama preferem folhas, brotos e frutos caídos, aproveitando a heterogeneidade da vegetação tropical (EISENBERG; REDFORD, 1999).

Verifica-se que os cervídeos brasileiros exibem uma considerável diversidade em seus comportamentos alimentares, adaptando-se a diferentes ecossistemas e disponibilidades de recursos. Principalmente herbívoros, esses animais se alimentam de uma variedade de plantas, incluindo folhas, brotos, frutos e cascas de árvores. As dietas podem variar bastante entre as espécies, refletindo as condições ambientais e a sazonalidade dos alimentos. Por exemplo, durante a estação das chuvas, é comum que muitas espécies se alimentem de folhas tenras e vegetação abundante, enquanto na estação seca, a escassez de recursos pode levar a um aumento no consumo de frutos e cascas, que são mais resistentes às condições adversas.

As estratégias de forrageamento dos cervídeos são fundamentais para a sua sobrevivência e reprodução. Eles frequentemente empregam comportamentos de forrageamento que são afetados por fatores como a disponibilidade de alimento e a pressão predatória. A algumas espécies, como o veado-campeiro (Blastocerus dichotomus), utilizam áreas alagadas para forragear, enquanto outros, como o cervo-do-pantanal (Mazama gouazoubira), são mais adaptados a ambientes de florestas. Esses hábitos podem incluir não apenas a busca de alimento em diferentes habitats, mas também a escolha de horários específicos do dia para se alimentarem, muitas vezes se tornando mais ativos durante as primeiras horas da manhã e no final da tarde, quando as temperaturas são mais amenas.

Além disso, a movimentação dos cervídeos em relação à forrageamento é muitas vezes influenciada pela competição com outras espécies e pelo comportamento de grupo. A formação de grupos sociais pode facilitar a localização de áreas ricas em recursos, reduzindo ainda mais os riscos associados à busca de alimento em ambientes mais expostos. A flexibilidade em suas dietas e machucados para otimização de forrageamento permite que essas espécies se mantenham viáveis mesmo diante de mudanças ambientais e flutuações sazonais na disponibilidade de alimentos.

Migração e Movimentação Espacial

A migração e a movimentação espacial dos cervídeos brasileiros são aspectos fundamentais para a compreensão de suas estratégias adaptativas. Esses mamíferos, pertencentes à família Cervidae, demonstram comportamentos variados ao se deslocarem em busca de alimento, abrigo e durante os períodos reprodutivos. A dinâmica de movimento é influenciada por fatores como a disponibilidade de recursos e as condições climáticas, que afetam diretamente a sua sobrevivência.

O cervo-do-pantanal pode apresentar deslocamentos sazonais em busca de áreas mais secas durante períodos de cheia, mas não realiza migrações longas como cervídeos do Hemisfério Norte (TOMAS; SALIS, 2000). Os veados do gênero Mazama, por sua vez, apresentam territórios menores e não migratórios.

Em geral, os cervídeos podem ser classificados como espécies sedentárias ou migratórias. Enquanto algumas espécies, como o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus), mantêm um padrão de movimentação mais restrito, outras podem realizar deslocamentos consideráveis em resposta a mudanças sazonais. O ciço (Mazama gouazoubira), por exemplo, é conhecido por sua mobilidade em áreas urbanas e rurais, adaptando-se a diferentes habitats. Essa flexibilidade em seus movimentos é uma estratégia crucial para encontrar alimento, especialmente em locais onde a vegetação varia ao longo do ano.

Durante a época da reprodução, os machos de várias espécies de cervídeos demonstram um comportamento notável ao se deslocarem para áreas onde a competição por fêmeas é mais intensa. Esse fenômeno é particularmente visível na época do acasalamento, onde muitos machos se aventuram para distâncias maiores, aumentando suas chances de sucesso reprodutivo. A migração para áreas específicas durante a estação de acasalamento não só garante melhores oportunidades de acasalamento, mas também facilita a busca por ambientes propícios para a criação da prole.

Além disso, a movimentação espacial dos cervídeos é frequentemente influenciada por interações sociais. Esses animais tendem a formar grupos, os quais podem afetar os padrões de movimentação e os recursos utilizados, mostrando que a ecologia social está intimamente ligada à sua estratégia de deslocamento. Em suma, a compreensão dos padrões migratórios e da movimentação espacial dos cervídeos brasileiros é vital para a preservação e manejo adequado dessas espécies.

Reprodução e Ciclo Reprodutivo

O sistema é basicamente polígino, com machos buscando acasalar-se com várias fêmeas.

· Ciclo Reprodutivo: Diferente de cervídeos de latitudes altas, as espécies brasileiras não possuem uma estação reprodutiva (cio) tão sincronizada e definida. A reprodução pode ocorrer ao longo do ano, com picos relacionados à disponibilidade de alimento.

· Rituais: Não há bramidos espetaculares como no cervo-vermelho. A corte é mais discreta, baseada no seguimento da fêmea pelo macho, que utiliza o flehmen (curvatura do lábio superior) para analisar seus feromônios e determinar o momento de receptividade sexual.

· Cria dos Filhotes: As fêmeas dão à luz geralmente a uma única cria, que é "escondida" na vegetação nos primeiros dias de vida ("estrategista do esconderijo"). A mãe visita o filhote apenas para amamentá-lo, minimizando o risco de atrair predadores.

A reprodução é influenciada pela sazonalidade ambiental. No cervo-do-pantanal, o período reprodutivo está associado ao final da estação seca, quando há melhores condições alimentares. Os machos exibem comportamento agressivo e confrontos utilizando galhadas. Já os veados Mazama apresentam comportamento reprodutivo mais discreto, com encontros rápidos entre machos e fêmeas. O cuidado materno é fundamental, e os filhotes permanecem escondidos nos primeiros dias de vida para evitar predação (DUARTE; REIS, 2012).

A reprodução dos cervídeos brasileiros apresenta um conjunto variado de estratégias e comportamentos que são fundamentais para a sobrevivência e adaptação das espécies ao seu ambiente. Essa diversidade é particularmente evidente nas práticas de courtship, que incluem rituais elaborados e interações sociais. Durante a estação de acasalamento, que geralmente ocorre por volta da primavera e verão, os machos realizam exibições físicas e sonoras para atrair fêmeas. Essas demonstrações podem incluir a exibição de seus galhos, vocalizações distintas e marcação de território, tornando-se essenciais para o sucesso reprodutivo.

O ciclo reprodutivo dos cervídeos é marcado por um período de rut (ou cio), que geralmente dura apenas algumas semanas. Durante esse tempo, as fêmeas apresentam sinais de receptividade, como mudanças no comportamento e na postura, e podem atrair múltiplos machos, sendo comum a competição entre eles. A fecundação ocorre, em geral, após o acasalamento, resultando em períodos de gestação que variam entre as diferentes espécies, o que impacta diretamente as estratégias de cuidados parentais.

Os cuidados parentais também variam consideravelmente entre as espécies de cervídeos. Em muitos casos, as fêmeas cuidam exclusivamente da prole, mas em algumas espécies, a presença do macho durante o período inicial é observada, o que pode ajudar na proteção dos filhotes contra predadores. O desmame ocorre geralmente entre quatro a seis meses após o nascimento, mas as fêmeas podem continuar a cuidar de seus filhotes por períodos mais longos. Essa variabilidade reprodutiva evidencia as adaptações de cada espécie às condições ecológicas específicas de seu habitat, sendo essencial para a sua perpetuação no meio ambiente. O entendimento desses aspectos reprodutivos contribui para a conservação e manejo efetivo dos cervídeos brasileiros, realçando a importância de estratégias que considerem as características de cada espécie.

Considerações para a Conservação

Os cervídeos brasileiros apresentam grande diversidade comportamental, refletindo adaptações aos diferentes ambientes do território nacional. O cervo-do-pantanal, mais gregário e associado a áreas alagáveis, contrasta com os veados do gênero Mazama, solitários e territorialistas. A comunicação, a demarcação de território e os cuidados maternos são comportamentos centrais para a sobrevivência dessas espécies.

A compreensão de seus padrões de vida em grupo, territorialidade, comunicação, alimentação e reprodução é fundamental para o desenvolvimento de estratégias de manejo e conservação. Considerando as pressões antrópicas, como a perda de habitat e a caça, pesquisas etológicas sobre essas espécies devem ser priorizadas, de forma a assegurar sua sobrevivência e a manutenção dos processos ecológicos nos biomas brasileiros.

O comportamento das espécies de cervídeos brasileiros está diretamente ameaçado pela ação antrópica. A fragmentação de habitats isola populações, impede a dispersão de jovens e interfere nos rituais de acasalamento. O veado-mateiro, por depender de florestas contínuas, é particularmente vulnerável. O cervo-do-pantanal, por sua vez, sofre com a alteração do regime de cheias e a expansão agropecuária. O veado-catingueiro, embora mais resiliente, enfrenta altas taxas de atropelamento e caça. Programas de conservação devem, portanto, considerar não apenas a proteção das espécies, mas também a manutenção da integridade dos processos ecológicos e comportamentais que garantem sua sobrevivência.

Referências

  • DUARTE, J. M. B.; REIS, M. L. (Eds.). Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Cervídeos Ameaçados de Extinção. ICMBio, 2012.

  • DUARTE, J. M. B.; REIS, M. L. Os cervídeos do Brasil: biologia e conservação. Jaboticabal: FUNEP, 2012.

  • EISENBERG, J. F.; REDFORD, K. H. Mammals of the Neotropics. Chicago: University of Chicago Press, 1999.

  • JARDIM, M. M. A. Dieta de Mazama gouazoubira (Cervidae) em área de Caatinga, Sergipe, Brasil. 2015. 45 f. Dissertação (Mestrado em Ecologia e Conservação) - Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2015.

  • PIOVEZAN, U. et al. Análise de viabilidade populacional e de habitat para o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus) no Brasil. Biodiversidade Brasileira, v. 10, n. 1, p. 01-17, 2020.

  • TOMAS, W. M. et al. Mammals of the Pantanal wetland, Brazil. In: The Pantanal: Ecology, Biodiversity and Sustainable Management of a Large Neotropical Seasonal Wetland. Sofia: Pensoft Publishers, 2010. p. 563-616.

  • TOMAS, W. M.; DUARTE, J. M. B. Conservação de cervídeos sul-americanos: desafios e perspectivas. Natureza & Conservação, v. 10, n. 2, p. 1–12, 2012.

  • TOMAS, W. M.; SALIS, S. M. Diet of the marsh deer (Blastocerus dichotomus) in the Pantanal wetland, Brazil. Studies on Neotropical Fauna and Environment, v. 35, n. 3, p. 165–172, 2000.

  • VIEIRA, E. F. Ecologia e conservação de Mazama americana (Cervidae) na Mata Atlântica. 2008. 120 f. Tese (Doutorado em Ecologia) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2008.

Como Citar:

Portal DOUTORZOO. NUNES, A. C. S. P. ; BORGES, L. C; ROCHA, D.  C. C. Comportamento e Ecologia dos Cervídeos Brasileiros: Uma Revisão das Espécies e Suas Estratégias Adaptativas. Série: Conservação e Manejo de Fauna/ Comportamento e Bem Estar Animal/ Cervídeos. Artigo Técnico/ Conscientização/ Ponto de Vista nº2. Disponível em: https://doutorzoo.com/comportamento-e-ecologia-dos-cervideos-brasileiros-uma-revisao-das-especies-e-suas-estrategias-adaptativasPublicado em 2025. Acesso em DIA/ MÊS/ ANO

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